sábado, 22 de novembro de 2008

DOUTOR SUCESSO

Você já ouviu falar em Christopher Langan? Provavelmente, não. Ele é um americano de 51 anos que ficou conhecido desde o final dos anos 1990 como o “homem mais inteligente da América”. Dos Estados Unidos, quer dizer. Os testes mostram que Langan tem um Q.I. de 195. Albert Einstein, o gênio que revolucionou a Física, tinha Q.I. de 150. Qualquer um com Q.I. acima de 150 é considerado gênio.

Apesar dessa enorme vantagem comparativa, Langan passou a maior parte da vida trabalhando como porteiro em um bar na região de Nova York. Nas horas de folga, estudava Física e Filosofia por conta própria. Escreveu em casa uma espécie de teoria-geral-de-todas-as-coisas, que jamais foi publicada e provavelmente jamais será. Neste ano, venceu um programa de perguntas na TV, no qual competiu sozinho contra um grupo de 30 pessoas. Tudo sugere que Langan poderia ter sido um cientista notável, mas ele não teve sorte. Nasceu numa família miserável, em que cada um dos quatro filhos tinha um pai diferente, todos mortos ou ausentes. Nunca conseguiu passar do colégio. Ganhou duas bolsas para a universidade e duas vezes as perdeu – com um boletim cheio de As – porque lhe faltava apoio material e afetivo para prosseguir. Numa das ocasiões, a mãe não se deu ao trabalho de assinar um atestado confirmando que a família continuava pobre.

Com essa história triste, o escritor Malcolm Gladwell abre o terceiro capítulo de Fora de Série, a História do Sucesso, lançado na semana passada nos Estados Unidos com o título de Outliers (a tradução chegará ao Brasil em dezembro pela editora Sextante). É o terceiro livro de Gladwell. Ele já escreveu dois best-sellers: Ponto de Desequilíbrio (2000) e Blink, a Decisão num Piscar de Olhos (2005). Eles foram traduzidos para 25 países e venderam 4,5 milhões de cópias. Tornaram seu autor um misto de celebridade, guru e milionário, aquele tipo de pessoa abordada na rua por estranhos, que recebe US$ 50 mil por palestra. Com Fora de Série, Gladwell deve repetir ou ampliar o impacto de seus livros anteriores. Na quinta-feira passada, Outliers já era o terceiro na lista de mais vendidos na livraria virtual Amazon.

Gladwell diz que sempre quis entender por que alguns se davam tão bem na vida – e outros não. Parece ser algo pessoal. Miúdo e inquieto, ele tem pai inglês branco e mãe jamaicana, de ascendência negra. Na tradição cultural anglo-saxã, é negro. Foi criado na zona rural do Canadá e poderia ter parado por aí. Mas seus pais eram ambiciosos, ele destacou-se na escola e terminou na universidade, onde cursou História. Antes de ser jornalista, tentou ser publicitário, sem sucesso. Nos Estados Unidos, fez uma carreira brilhante de repórter. Nos últimos oito anos, conquistou fama e fortuna como escritor. Costuma se apresentar, com desconcertante modéstia, como “parasita das idéias dos outros”. Agora, diz que, parasitando, entendeu os mecanismos do sucesso.

“Nós somos focados demais no indivíduo”, diz Gladwell. “Para realmente entender os fora de série, temos de olhar ao redor deles: para a cultura, para a família, para a comunidade e para a geração deles”. Ele não afirma que o talento ou a ação individuais não sejam importantes. Há milhares de exemplos para provar o contrário. Ele afirma, apenas, que talento, inteligência e personalidade não explicam tudo.

Quem é Malcolm Gladwell – e o que ele diz
Brooke Willians
NÃO BASTA SER GENIAL
Gladwell, em foto de 2005. Ele diz que para entender o sucesso é preciso olhar para além do indivíduo: a família, a comunidade e as circunstâncias
QUEM É
Nasceu na Inglaterra e foi criado na zona rural do Canadá. Tem 45 anos e escreve para a revista The New Yorker

É filho de uma psicoterapeuta jamaicana e de um professor de Matemática inglês. Magro e miúdo, tem pele e olhos claros, mas se apresenta como negro

Aos 14 anos, detinha o recorde canadense de velocidade para 1.500 metros. Seu pai diz que ele “se alimenta” de competição. É o mais novo de três irmãos homens

A família é presbiteriana. Todas as noites os pais liam para os filhos a Bíblia e trechos dos romances de Charles Dickens. Não havia TV em casa

Na faculdade de História, Gladwell pôs um pôster de Ronald Reagan em seu quarto. Seu primeiro emprego foi na revista conservadora American Spectator

Seus livros anteriores – Ponto de Desequilíbrio e Blink, a Decisão num Piscar de Olhos – venderam 4,5 milhões de exemplares

Por causa dele, criou-se o verbo “gladwellizar”, com o sentido de subverter o senso comum e olhar as coisas de uma perspectiva inusitada, contra-intuitiva

O QUE ELE DIZ
“Conheço um monte de pessoas extremamente inteligentes, enormemente ambiciosas, que nunca
se tornaram um Bill Gates. Está claro para mim que nosso entendimento das causas do sucesso ainda é precário”

“Não é suficiente perguntar como são as pessoas bem-sucedidas. É apenas perguntando de onde elas vêm que podemos entender a lógica por trás de quem faz e de quem não faz sucesso”

“Somos focados demais no indivíduo.
Para realmente entender os fora de série, temos de olhar ao redor deles – para a cultura, para a família, para a comunidade e para a geração deles”

“Para se tornar um grande mestre do xadrez, são necessários dez anos. O que são dez anos? Bem, é mais ou menos o que leva para obter 10 mil horas de prática. Dez mil horas é o número mágico da grandeza”

“Não acredito em caráter. Acredito no efeito do ambiente e da situação no comportamento das pessoas” 

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