segunda-feira, 7 de setembro de 2009

O Charuto e as Mulheres



Degustar um charuto é uma sensação única. Este artefato é capaz de fechar com chave de ouro uma boa refeição, de fazer par com uma bela bebida ou mesmo complementar um bom papo. O hábito sempre esteve relacionado à sofisticação, personalidade, charme e estilo, mas foi historicamente associado ao universo masculino, como um prazer exclusivamente reservado aos homens.

Quando se tenta unir as imagens de charutos e mulheres, rapidamente vem à mente a tradicional figura das tabaqueiras nas fábricas enrolando o tabaco. Uma visão no mínimo simplista, já que muitas mulheres fazem parte da trajetória do charuto - desde o plantio do tabaco até o consumo final, papel este que a mulher vem cumprindo cada vez mais.

Voltando um pouco na história, uma das versões da criação da anilha, o anel de papel que envolve o charuto com o logo ou nome da marca, é atribuída à rainha russa Catarina, a Grande. A rainha era uma aficionada por charutos e ordenou que eles fossem envolvidos em um pedaço de seda para que não manchassem suas luvas.

Já em Cuba, quando Fidel Castro decidiu criar a Cohiba, notou que na época o número img_0753de homens trabalhando com tabaco era superior ao de mulheres. Por isso, decidiu criar uma escola para que elas pudessem aprender a manufatura do produto. Depois de um ano de aprendizado, a primeira turma estava apta para a produção e, em 1966, iniciou nas atividades da marca.

A relação da Cohiba com as mulheres não pára por ai. O nome Cohiba, inspirado na palavra indigena para os rolos de folhas secas que os índios fumavam, foi sugerido por uma mulher, Celia Sánchez Manduley, guerrilheira e principal auxiliar do comandante Fidel Castro. Mais recentemente, em 1995, a mesma empresa teve a primeira mulher no cargo de diretora em uma fábrica de charutos do mundo. Emilia Tamayo trabalhava na área contábil da Cohiba, mas teve seu excelente trabalho reconhecido e passou a diretora, onde ficou famosa pelas melhorias que fez na empresa.

É impossível não mencionar também as diversas mulheres do universo artístico que sempre estiveram acompanhadas por um charuto. É esse o caso da escritora, poetisa e feminista americana Gertrude Stein, a poetisa Amy Lowell e das romancistas francesas Sidonie Gabrielle Colette e George Sand.

charuteira_2Já a soprano australiana Nellie Melba recebia os melhores charutos da extinta fábrica cubana La Africana, conhecida também por ter sido a primeira empresa tabaqueira a empregar uma mulher, em 1878. Atrizes como Marlene Dietrich, Jodie Foster, Whoopie Goldberg, Demi Moore, Drew Barrymore, Sharon Stone, Linda Evangelista e Nicole Kidman e a cantora brasileira Fafá de Belém também são apaixonadas pela arte das baforadas. Até mesmo Bonnie Parker, da famosa dupla de criminosos americanos Bonnie e Clyde, arrumava tempo entre seus assaltos para degustar um puro.

Apesar de tantos episódios relacionando o tabaco às mulheres, ainda existe uma grande (e falsa) convenção de que charutos são para homens, o que sustenta pensamentos preconceituosos de que as consumidoras têm um ar masculino. O lendário Zino Davidoff, criador da marca Davidoff, costumava dizer “se sua mulher não gosta do aroma do seu charuto, troque de mulher”. Mas os tempos estão mudando e atualmente Vahé Gérard, proprietário da mundialmente conhecida loja Gérard Père & Fils em Genebra, afirma com humor que “se sua mulher não gosta do aroma do seu charuto, troque de marca”, referindo-se à maior sensibilidade e sentidos mais apurados que elas possuem.

Para as mulheres que têm vontade de se iniciar nessa arte, mteesecigarrex_468x616as ainda se sentem constrangidas de freqüentar tabacarias, uma boa maneira é começar freqüentando as inúmeras confrarias de mulheres que apreciam charutos, já existentes no Brasil.

O meu envolvimento com este universo iniciou durante a faculdade de hotelaria. Comecei a me aprofundar no assunto e posso dizer que foi amor à primeira vista. E foi assim que o charuto se tornou uma paixão e parte da minha vida.
Confesso que no inicio tive certa dificuldade para entrar nesse mundo tão masculino. Adorava ir a tabacarias, mas me sentia incomodada porque quase sempre era recebida com perguntas como “veio comprar um presente?”, ou então, “é para o seu pai?” e quando respondia com uma negativa, então o vendedor insistia em oferecer charutos mais suaves ou aromatizados, pois “combinavam mais com as mulheres”.

Mas não desisti e percebi que a melhor maneira de vencer esse preconceito era entender do assunto. E foi na minha busca por informações e cursos de charutos que conheci o especialista em tabacos César Adames, que me ensinou muito sobre o assunto. Além disso, visitei as fábricas de charuto no Recôncavo Baiano e em Cuba, onde pude aprender e ver na pratica a sofisticada produção de charutos.
Neste momento, o charuto era apenas um hobby, até que uma interessante surpresa aconteceu. Uma vez por ano acontece o campeonato nacional de Epicure Sommelier (profissional responsável pela harmonização de bebidas e charutos), mas para participar desse concurso é necessário trabalhar no ramo. Porem, no ano de 2007 houve uma exceção. Foi realizado um campeonato idêntico ao nacional para os alunos que cursavam a pós graduação em Gestão de Bebidas com Ênfase em Vinhos no Senac e quem ganhasse, teria direito a participar do campeonato nacional, mesmo não trabalhando na área. Como estava cursando essa pós graduação, participei deste campeonato do Senac e venci. Com isso, obtive o direito de participar do campeonato nacional, no qual alcancei o 2º.lugar.

Por conta desse resultado, fui convidada a trabalhar na Tabacaria Lenat, como Epicure Sommelier, que foi uma experiência única e muito gratificante. E para compartilhar meu interesse por esse universo fascinante vou escrever todos os meses no Basilico sobre os diversos aspectos desse delicioso hábito. Boas baforadas para todos nós.

fernandaayoub_internaFernanda Ayoub é formada em hotelaria e uma apaixonada por charutos. Vice-campeã do campeonato nacional de epicure-sommelier de 2007, ela representa a nova geração de charuteiros.

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